segunda-feira, 16 de novembro de 2009

A Mulher e a Lua


A Lua tem sido , desde os tempos antigos, a inspiração para músicos , poetas, trovadores e pintores. Sempre envolta em mistérios, já foi objeto de adoração , nos primórdios da civilização, por povos que viam nela a deusa da fertilidade. E nessas culturas antigas, a primeira forma de medir o tempo foi pelo ciclo menstrual, sincronizado ao ciclo lunar.
Como na antiguidade a contagem do tempo se baseava em fenômenos naturais repetitivos, a lua, assim como o sol, serviram de fundamento para a elaboração de calendários. Vemos heranças dessa prática, por exemplo, no calendário judaico, que se baseia no movimento lunar e no qual todos os meses se iniciam na lua nova. O calendário mulçumano segue princípio similar, e mesmo o cristão baseia-se na lua para determinar o dia da Páscoa a cada ano ( primeiro domingo após a primeira lua cheia da Primavera no Hemisfério Norte, ou primeira lua cheia do Outono no Hemisfério Sul ).
A Lua influencia o desenvolvimento e o crescimento das plantas, o movimento das marés e dos fluidos corporais, o ciclo menstrual, a concepção, geração e nascimento de todos os seres vivos. Com isso, desde a antiguidade, considera-se a existência de um elo entre a Lua, a fertilidade e os nascimentos.
A mulher vive as fases da lua em seu útero e nas variações hormonais a cada mês. A fase crescente pode ser ilustrada pelo crescimento e espessamento do endométrio, revestindo as paredes do útero , e alcançando seu ápice de “lua cheia”- quando o endométrio está no seu máximo de crescimento, pronto para receber e nutrir o ovo que venha a ser fertilizado. E se acontece a concepção, a mulher passa a extender sua fase de lua cheia, vendo seu ventre crescer ao gerar uma vida dentro de si. Não ocorrendo a concepção, ocorre a involução do endométrio, sua descamação e eliminação pela vagina ( menstruação). Então, podemos comparar essa fase com a lua minguante, lembrando que em seguida o ciclo recomeça, e a mulher pasa a viver sua lua nova. Esse aumento e diminuição de endométrio são regidos, a grosso modo, por variações na produção de estrógeno e progesterona, constituindo verdadeiras marés de hormônios.

Embora muitas vezes não perceba, a mulher por conta dessas mudanças em seu organismo, dança o ritmo da natureza, e tem, se despertada a consciência ,estreita relação com os ciclos da vida: nascimento, vida e morte . Ela guarda em sí a possibilidade de gerar vidas e nutri-las e, por mais essa razão, foi associada à figura da Lua em rituais de fertilidade, nas culturas antigas.
Foi observando os ciclos da vida é que ela iniciou a semeadura , nos primórdios da evolução humana, pois tinha habilidades e noções de plantio , simplesmente observando que as sementes dos frutos consumidos, quando jogados na terra, germinavam, transformavam-se em plantas e davam novos frutos. E aliada a essa observação, percebia o tempo propício para o plantio, que dependia das fases da lua e das estações do ano. O homem concentrava sua energia e percepção para a caça, sempre distante da habitação, deixando para a mulher a tarefa de cuidar e nutrir a prole, completamente inserida nos ritmos lunares. Ela que era geradora de vidas, compreendia o ciclo das criações, das plantas e dos animais.
Simbolizava-se as fases do feminino como Virgem ( início dos períodos menstruais e ingresso à vida adulta ) , Mulher ( auge da sexualidade e da procriação ) e Anciã ( maturidade), espelhadas nas respectivas fases Crescente, Cheia e Minguante da Lua. O feminino, portanto, era vivido na sua plenitude : a menstruação e a sexualidade, eram vistos como partes de um processo natural- a fertilidade - e eram consideradas sagradas.
Nos dias de hoje, esse vínculo entre mulher e Lua é praticamente inexistente, ou na melhor das hipóteses, diluído entre tantos conceitos científicos e tecnologia de ponta. A medicina trouxe o poder de controle sobre os ciclos menstruais e sobre a fertilidade, fato esse positivo para o contexto da vida moderna, mas que por outro lado, quebra o elo entre o feminino e os ciclos lunares. Quebra-se também a relação natural com os princípios de nascimento,vida e morte. E como uma das consequências dessa quebra, criou-se, na sociedade , o valor vingente do novo, da juventude eterna, da energia na sua máxima potência. A maturidade passa a ser indesejável e muito combatida. A menopausa , paradoxalmente , é vista como época de se livrar do incômodo dos períodos menstruais , porém como a decadência da sexualidade da mulher.
Marcia Frazão retrata muito bem essa realidade em trechos de seu livro O Feitiço da Lua:
“ Com a inocência própria das feiticeiras que se iniciam, enchi-me de dúvidas. Será que a mulher só é mulher por um tempo? E quando ela deixa de ser mulher, no que é que ela se transforma? E se ela deixa de ser mulher com uma determinada idade, em que gênero se encaixariam as anciãs?”
“ A lua da Loba trouxe-me a certeza de que uma mulher será sempre uma mulher, independente do que se diga, se está ficando velha, se está tomada pelas rugas, ou se a menopausa chega e o sangue desaparece, ela sempre será uma filha de Afrodite. Por mais que tenha lutado contra isso, a deusa estará oculta em alguma prega de seu corpo, pulsando os suspiros lascivos dos sonhos de Lilith."

LinkWithin

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...